O trabalho já definiu os “bons” dos “maus”.
Um dia já fomos regidos pelo trabalho. Ser trabalhador dava aos seres humanos um prestígio, uma honra, em meios aos seus. “Quem trabalha merece respeito”, este já foi um lema importante.
Aquele que trabalhava recebia crédito e méritos. O sustento do trabalho lhe dava a condição de independência. Passava a ser considerado como relevante e os rituais familiares, por exemplo, o exaltavam como uma prioridade no lar.
Seria para aquele que trabalha que se dava os recursos, o mando e o controle da vida doméstica. O culto ao trabalho fazia de meninos e meninas educados desde cedo para o papel que o trabalho lhe daria na fase adulta.
Não por acaso, mesmo sofrendo as perdas de uma vida com regalias, sair de casa era sinônimo de autonomia financeira. O desejo era antecedido pelo ganho e seria uma consequência do trabalho. Logo, era preferível reduzir a possibilidade de consumo e ser livre financeiramente trabalhando.
As coisas explicam as pessoas.
Diferente de hoje em que o desejo é o consumo e não a condição que permite consumir. Se quer muitas coisas e não se considera o que devemos ter para podermos realizar o nosso desejo. Mais que isso, o ser que pode adquirir só é importante pela aquisição. Desumanizamos as pessoas e humanizamos as coisas.
O trabalho virou uma ilusão retórica. Ele deve existir enquanto o consumo o sustentar. Se inverteu a lógica do porque viver. Vivemos para o consumo e não para o trabalho.
O que se faz é condição do que se deseja, consumir e continuar consumindo. A busca pelo que falta é o sentido de ser de quem vive na ausência, alimentado por algo imediato, nada que dure. Mas há a presença eterna, sempre, mas sim de um novo desejo.
Não se pode acabar com o desejo intenso e pueril para que as pessoas não se tornem ausentes de viver à espera de algo novo. A depressão é curada com as emoções em migalhas das pequenas aquisições. Colecionamos desejos em vez de construirmos uma vida.
Pagamos o preço elevado pela ausência de uma lógica que justifique uma vida inteira. Por isso, temos sonhos curtos e vamos andar sobre uma linha tortuosa na vida. Que, ao se olhar em sua existência, conforme o tempo passa, não percebemos o sentido do porque estamos vivendo.
Logo, uma vida deve ser mais do que um dia atrás do outro, deve ter um sentido que seja além do imediato. Nosso olhar sobre a existência deve alcançar um horizonte além do próximo passo, é mirar longe. E não importa se vamos alcançar este grande objetivo, o que importa é que ele justifica uma vida inteira.