Em países onde a democracia se constituiu de forma centralizada, obedecendo a um poder central, o caso de parte considerável dos governos latino-americanos, há uma dificuldade imensa de entender a representatividade como uma relação próxima entre o povo e os representantes públicos.
No caso brasileiro, a formação do Estado Nacional é uma construção autoritária. O poder se estabeleceu na capital da colônia, Rio de Janeiro, em 1808, com a transferência da corte portuguesa. Condição que se colocou distante da vontade popular. Por sinal, o povo se fez pelas fronteiras delimitadas da autoridade governamental estabelecida com as medidas do príncipe regente Dom João VI.
Ao longo da história brasileira, os mandos e desmandos da autoridade estabelecida se sobrepuseram aos interesses ou representações populares. Não podemos esquecer a longa jornada da escravidão dentro do território. O que consolidou um não reconhecimento do povo com o Estado. O sentimento de não representação e sim o de mando e imposição.
Porém, nos fizemos república representativa. Nas diversas constituições que foram promulgadas, sem falar as outorgadas, 1824 e 1937, há a existência de um parlamento. Ele efetivamente tem um poder de deliberação. Os parlamentares, deputados e senadores, podem definir e gerar a condição de governo. Aprovar medidas fiscalizar ou fazer vistas grossas aos atos do Poder Executivo.
Em grande parte, desconhecemos isso, não damos atenção. Apenas, como na atualidade, ficamos acompanhando as votações do Congresso que viram notícia e percebemos pontualmente a influência sobre nossas vidas. Porém, todas as decisões legislativas nos dizem respeito, afetam nossas vidas. Os parlamentares têm um poder imenso, intenso e decisivo. Quando vamos nos dar conta disso?
Hoje, com a ascensão de Jair Bolsonaro ao poder, temos um impasse de governabilidade entre o parlamento e a presidência da república. As negociações costumeiras, construídas ao longo de mais de 190 anos se impõe. O que chamamos de clientelismo, trocas de favores, busca de influência e manutenção do poder de homens públicos acima da população está arraigado.
Acreditamos, nas campanhas políticas daqueles que disputam o executivo, de que tudo se dará por uma decisão do “chefe maior da nação”. Na prática, as coisas não funcionam assim. O parlamento é o grande campo de decisões que fazem a governabilidade uma estabilidade e uma expressão do projeto político do país. Nós, a população, podemos ou não estarmos incluídos como prioridade. Ao longo da história, muito pouco.
As dificuldades de aprovação das reformas necessárias para a retomada da economia, para a regularização do orçamento, esbarram no poder viciado e cristalizado. Uma renovação dos Congresso, significativa, como vimos nas últimas eleições, fizeram retornar homens públicos tradicionais e novos personagens. Logo, há os que sabem fazer a política de manutenção do clientelismo, os que são novos na casa de leis não conseguem agir pela inexperiência. Alguns se habituam outros desaparecem por não saber as regras do jogo de poder.
A república democrática é a melhor forma de governo. O poder do parlamento não é ruim. A representatividade dos parlamentares é uma ótima receita. Contudo, os vícios e práticas do ambiente político as emperram, distorcem e abrem espaço para os abusos. O problema está em nossa ausência de organização e votação consciente nos legisladores.
Não por acaso, sempre se afirma que a verdadeira cidadania é praticada diariamente. Ela significa acompanhar os órgãos públicos, a ações dos representantes nas casas legislativas, municípios, estados e União. Sem está prática nada vai mudar. Tudo será apenas uma tentativa retórica e ilusória de que um dia teremos um estado de direito e representativo.
Ou seja, diante de uma velha forma de fazer política, quem não se renova é o cidadão, o povo, a sociedade, que não toma para si a responsabilidade de cuidar de suas escolhas e com a convivência com a política amadurecer e aprender a escolher quem realmente pode mudar a sua vida.